Pressupostos Errados

Passou 1 ano desde que escrevi este artigo (que faz parte dos que, sem querer, desapareceram do blog) e nada mudou, ou melhor, muita coisa mudou.

Cada vez mais a minha relação com o telemóvel é cada vez mais distante. Cada vez menos o atendo, aliás passa a maior parte do tempo no silêncio ou quase. As sms passam-me, muitas vezes, ao lado. Fartinha...



"As pessoas pressupõem que por eu ter telemóvel que tenho de atender o telefone ou retribuir a chamada, tal como pressupõem que tenho de abrir a porta da minha casa quando tocam à campainha ou dar os meus dados bancários, ou..., ou... As pessoas vivem de pressupostos!

Existe no Mundo um anarquismo e uma prepotência de achar que temos de estar disponíveis 24h por dia para aquilo que os outros quiserem. Existe um desrespeito pela vida privada das pessoas e eles próprias desrespeitam-se ao permitirem essa constante interferência.

Como temos telemóvel temos de estar contactáveis, como o telemóvel tem roaming e email temos de estar contactáveis, como temos telemóvel pessoal temos de estar contactáveis (também nesse). Como temos conta bancária temos de dar os dados e como estamos em casa temos de abrir a porta.

Eu já cheguei a ter 2 números de telefone por causa disso e isso trazia-me custos mas eu pensava que assim comprava o meu sossego até que um dia parei para pensar e vi que todo o Mundo está errado e sem querer descobri pessoas como eu: cansadas de pressupostos.

Agora imaginem eu juntar isto com a confusão da vida do meu marido: eu estava de férias ligavam, eu estava a jantar ligavam, eu estava a dormir ligavam, eu estava a fazer sexo ligavam... Irra!!!

A gravidez e principalmente a maternidade veio alterar muito a minha relação e a minha disponibilidade para com o Mundo que me rodeia. Cada vez estou mais ocupada no meu trabalho e impossibilitada de atender o telemóvel ou ler todos os emails que recebo e depois do trabalho tenho que fazer em casa e de estar com a minha família. Quero lá eu saber de falar sobre certas coisas nos transportes públicos, atender o telemóvel se estou a conduzir? Eu quero é sossego.

Quantas vezes a minha família liga e eu só me apercebo no dia seguinte? Muitas. Não tenho tempo para certas coisas e o tempo é tão pouco para estar com o meu filhote que não vou desperdiçar 1 segundo com futilidades, se acontecer alguma coisa urgente a alguém meu querido eu saberei. Acreditem que saberei.

A Travelbird não me paga o que deve porque exige como única forma de pagamento os meus dados bancários, que por lei não sou obrigada a fornecer mas eles têm que disponibilizar alternativas que por implicância não fazem. Pressupõe-se que sou obrigada a ter conta bancária e ainda exige que então forneça os dados de um amigo ou familiar.

Ontem ligou-me a Adicional a querer que eu confirmasse a minha morada e se eu tinha uma box da NOS. A mim ninguém me informou de nada e a senhora nunca disse o motivo do telefonema quis logo os meus dados - foi obviamente despachada. Eu percebi o motivo do telefonema quando ela começa a fazer perguntas da box NOS e subentendi que eles tinham sido contratados pela NOS para ir buscar a box que deviam ter ido buscar no dia 5 de Janeiro mas que não apareceram, mas a mim ninguém me disse nada. Pressupõe-se que eu sei do que falam e sem uma apresentação/explicação prévia.

No outro dia alguém ficou chateado porque não atendi o telemóvel e não retribui a chamada. Mas eu tenho de retribuir chamadas a quem quer falar comigo sobre assuntos do seu interesse? É que quem paga o meu telemóvel sou eu portanto eu é que decido o que faço com ele e a quem ligo porque quando eu tenho interesse em alguma coisa não paro de ligar até estar satisfeita e resolver algum assunto do meu interesse.

Aos amigos pessoais e familiares é diferente mas aos outros? E mesmo assim, sem querer, nem sempre consigo corresponder logo. Porque acham os outros que têm o direito de interferir na minha vida dessa maneira? A isto chamasse falta de respeito pelos meus direitos, pela minha forma de estar e ser. 

A invenção do telemóvel e da internet veio obrigar as pessoas a estarem sempre disponíveis e a obrigar os outros a querer que todos estejamos sempre disponíveis mas felizmente alguns de nós estão cansados e isto está a mudar. Começa a acabar a intervenção directa na vida das pessoas porque elas começam a travar essa intervenção: 

O Director X disse que estava de férias com a família e que nem podia respirar porque o telemóvel não parava de apitar, tudo era urgente e para ser tratado já - também ele está cansado e disse basta. Outro é informático e existem sempre problemas nas empresas, outra é administrativa e existe sempre alguma coisa que só ela sabe resolver... etc, etc. 

As pessoas tornaram-se loucas obsessivas pelas tecnologias, pelo urgente, pelo já, pela disponibilidade e pelo contactável. Parece que agora o Mundo acaba se alguém não estiver on line, não estiver com bateria ou som no telemóvel, se as coisas não forem feitas ontem.  

Tudo é urgente mas esquecessem-se que a maior urgência é ser feliz, ter saúde, desfrutar do tempo que a vida nos dá. Eu sou do tempo em que não havia internet, nem telemóveis e não vejo grandes diferenças a nível de menos fome, menos pobreza, menos guerras portanto do que nos serviu tanta "evolução"? Serviu para encontrar-mos uma nova forma de escravidão voluntária.


Por mim BASTA. Tenho vindo a cortar, com sucesso, as minhas amarras e as amarras que me prendem à obrigação da disponibilidade e se abusarem da minha paciência até corto o meu numero de telemóvel porque nada neste mundo me pode obrigar a viver presa a uma lei imaginária e uma opção imposta."

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